A maioria dos ministros do STF votou para que a Corte defina se presos que já cumpriam pena antes da revogação da saída temporária continuam tendo direito ao benefício. O tema terá repercussão geral, ou seja, a decisão do STF servirá de referência para todos os casos semelhantes no país.
Dos 11 ministros da Corte, nove votaram a favor da repercussão geral, o que também resultou na suspensão de todos os processos sobre o tema que tramitam no Judiciário. O assunto ainda é discutido em pelo menos quatro ADIns, mas esse tipo de ação não permite a interrupção de processos em instâncias inferiores.
Desde a promulgação da lei que extinguiu a saidinha, em maio de 2024, advogados de presos acionaram a Justiça para tentar impedir que a nova regra fosse aplicada a seus clientes.
O principal argumento das defesas é que uma norma criminal não pode retroagir para prejudicar o réu. Essa garantia está prevista na Constituição Federal, que estabelece que “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”.
Por outro lado, o MP argumenta que a nova legislação não altera a tipificação de crimes, mas apenas a execução da pena. Segundo essa interpretação, o direito à saída temporária deve ser analisado com base na lei vigente no momento da concessão do benefício, e não na legislação que estava em vigor quando o crime foi cometido.
Impacto na população carcerária
O relator do caso, ministro Luís Roberto Barroso, destacou a importância do julgamento, afirmando que a decisão pode afetar um grande número de presos.
“A definição sobre a possibilidade de retroação da lei 14.843/24 para execução de pena por crimes anteriores à sua vigência tem relevante impacto social, já que pode atingir parte expressiva da população carcerária brasileira.”
Segundo Barroso, o Brasil tem mais de 110 mil presos em regime semiaberto, diretamente impactados pela nova lei.
“Cuida-se, pois, de matéria com repercussão geral, sob todos os pontos de vista (econômico, político, social e jurídico), em razão da relevância e transcendência dos direitos envolvidos.”
O relator foi acompanhado pelos ministros Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, André Mendonça, Luiz Fux, Cristiano Zanin, Edson Fachin e Gilmar Mendes. O ministro Nunes Marques ficou vencido e a ministra Cármen Lúcia não se manifestou.
Entenda o caso
A repercussão geral foi aprovada em um recurso contra uma decisão da Justiça de Santa Catarina, que concedeu a saída temporária para um preso do Estado. A decisão foi baseada na interpretação de que a não retroatividade da norma penal é um direito fundamental do cidadão.
Além do caso de Santa Catarina, que já registrou 480 processos semelhantes, outras 40 apelações sobre o tema chegaram ao STF.
A nova legislação, promulgada em 2024, alterou a lei de execuções penais para restringir as saídas temporárias de presos condenados por crimes hediondos ou violentos. Com isso, foram extintas as saídas para visita familiar e ressocialização dos detentos em regime semiaberto.
Antes da mudança, presos desse regime tinham direito a deixar a prisão temporariamente em feriados como Páscoa e Natal. Também podiam ficar até sete dias sem supervisão para participar de atividades de ressocialização. A nova lei mantém as saídas para estudo, desde que autorizadas pela Justiça.
As autorizações para saída continuam dependendo de decisão do juiz da execução penal, que avalia critérios como bom comportamento, tempo de cumprimento da pena e compatibilidade do benefício com os objetivos da punição.
Agora, a decisão do STF definirá se os presos que já cumpriam pena antes da revogação da saidinha poderão continuar usufruindo do benefício.
- Processo: RE 1.532.446