(*) Hélio Consolaro
Quando você está velho ou velha? Segundo Millôr Fernandes, “chega o dia em que você não conhece mais ninguém realmente novo. Toda pessoa nova que você conhece não vem com absoluta originalidade visual. Sempre recorda alguém, existente ou já ido, cuja imagem se superpõe à dela, negando-lhe espaço completo em sua memória. Você está mesmo velho!”
Segundo o IBGE a expectativa de vida dos brasileiros é de 76 anos, já vivi tudo isso, atingi o ápice. Entrei na lambujem. E para meu regozijo, bem de saúde.
Na parte sexual, o talher envelheceu junto com o corpo, mas a medicina avançou muito, retira-se o zinabre, para tudo se arruma um jeito.
Já me preocupei com todos, agora todos vão ter que se preocupar comigo. Nem todos, pelos menos os gratos. E para complicar a caminhada, perdi a companheira de quase 50 anos de casado. Tornei-me um viúvo abandonado numa casa onde vivo há 43 anos. Mas nada de lamento, a vida é para ser vivida conforme Deus manda.
A gente pode até arrumar uma namorada (ou namorado) para não deixar morrer a vida afetiva, mas ela (ou ele) não tem obrigação de cuidar do doente, pois trata-se de um namoro. Se quiser auxiliar, não deve desprezar a oferta. Obrigação não há.
O psicanalista Contardo Calligaris, italiano que morava no Brasil, andou escrevendo semanalmente na Folha de São Paulo (1999-2021), inconformado dizia que sua vida na velhice era apenas cuidar de si, passara a fase de cuidar dos outros. Morreu com 72 anos de câncer em 2021.
Cuidar dos velhos é uma obrigação, não só da Previdência Social, mas também da família. O problema é que a configuração familiar mudou, milhões moram em minúsculos apartamentos e nem sempre permite inserir nela os idosos.
Se você, caro leitor, tiver recursos para cuidar de si, com bom plano de saúde e hospedar-se numa casa de repouso, devemos levantar nossas mãos para o céu. Não fique reclamando atenção 24 horas por dia, deixando o ambiente depressivo.
Eu não tenho vergonha alguma em pedir ajuda aos mais novos, não tenho comigo a filosofia “não quero dar trabalho”. Se cumpri bem todos os meus anos vividos, espero agora o retorno: cuidem de mim. Quero dar trabalho, nem que seja num asilo.
Pensar no futuro é ter recursos para viver bem sua velhice, não se trata de deixar uma boa herança para os descendentes. Se puder, se acontecer, deixe alguns bens para eles brigarem ao fazer o inventário.
PS. Nada de fazer empréstimo consignado para socorrer filhos netos.
(*) Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP. Membro das academias de letras de Araçatuba-SP, Andradina-SP, Penápolis-SP e Itaperuna-RJ