(*) Hélio Consolaro
Perder algum objeto de vista é o evento mais comum entre nós. Morando muitas pessoas numa mesma casa, ele acontece com mais frequência. Nesta semana, morando sozinho numa casa (não é apartamento), sumiu a coisa mais fácil de desaparecer: a chave do carro.
Verifico sempre à noite, antes de conversar com o travesseiro, se o carro está na garagem e testo suas travas e alarme. Nesta noite fatídica, não achei a chave. Não contente, fui até a garagem e percebi que as portas não estavam travadas. Desespero.
Com certeza, o meu carro pousou outras noites abandonado como ontem, sem que eu percebesse e ninguém tivesse roubado o meu possante. Mas uma coisa é me esquecer, durmo tranquilamente; a outra é dormir sabendo que meu patrimônio está desprotegido, o sono foi cheio de sobressaltos.
Apesar de bater cabeça com isso ser uma constante no meu cotidiano, ainda não tive coragem de comprar aplicativo ou dispositivo que localize objetos perdidos. Também não tenho fé suficiente para invocar São Longuinho, nem coragem de dar três pulinhos e três gritinhos. Posso ser mal-entendido.
Estátua no Santuário do Bom Jesus do Monte, Braga, Portugal |
Passei zap para a faxineira. No outro dia, ela foi especialmente à minha casa para localizar a chave. Pá de cá, pá de lá. Duas horas de trabalho. Achou no bolso de minha calça dependurada no mancebo, usada no dia anterior. Como? “Revirei os bolsos dela!” O chaveiro estava num desvio provocado pelo último conserto da algibeira. Como a Sandra é evangélica, não precisei dar os três pulinhos nem os três gritinhos.
Na viagem que fiz a Portugal, em outubro de 2024, visitei Braga, Santuário do Bom Jesus do Monte, e lá vi uma estátua monstruosa de São Longuinho, padroeiro dos achados e perdidos.
A hagiografia (estudo da vida dos Santos) registra várias histórias, lendas. São Longuinho, santo celebrado em 15 de março. Aqui só existe uma igreja com sua imagem, em Guararema, interior de São Paulo. “Longuinho vem de Longinus, nome comum aos mártires. O nome dele era mesmo Cássio.” O cara espetou o coração de Jesus na cruz com uma lança e o sangue jorrou em seu rosto. Ele se arrependeu e virou santo. Antigamente o perdão era mais usado.
Consegui terminar a crônica, vou dar três pulinhos e três gritinhos. Ufa!
(*) Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Araçatuba-SP