“Vocês salvaram a minha vida”. Foi o que ouviu a cabo Raiane Cavalcante após realizar um atendimento na Cabine Lilás, projeto voltado para mulheres vítimas de violência doméstica. A militar faz parte da primeira turma do programa, que começou em março na capital e na Grande São Paulo. Em breve, ele será ampliado para todas as regiões do estado.
Para garantir um atendimento especializado e humanizado às vítimas de agressão no interior paulista, cerca de 30 policiais passam por um curso de capacitação no Centro de Operações da Polícia Militar (Copom) de São Paulo. Durante o treinamento, elas têm aulas de psicologia, direito, redes de apoio, medidas protetivas e funcionamento das Delegacias da Defesa da Mulher (DDM).
Além disso, é ensinado fatores comportamentais na hora de atender a ligação, como a melhor forma de conversar, se expressar e o tom de voz adequado. A cabo Raiane passou por essa etapa há seis meses. “As aulas ajudam a te dar mais segurança ao passar as orientações”, afirma.
“Por outro lado, a cabine Lilás ajuda a vítima a ter mais conhecimento sobre o que fazer e os direitos dela em uma situação de violência, além de aumentar a confiança da vítima ao falar sobre o caso, já que ela fica mais à vontade quando vê que está falando com uma policial mulher, que é exclusivo dessa ação”, conta a militar.
Ao final do curso, 20 policiais serão destinadas para os centros de operações da PM do interior, sendo duas para cada macrorregião: São José dos Campos, Campinas, Ribeirão Preto, Bauru, São José do Rio Preto, Santos, Sorocaba, Presidente Prudente, Piracicaba e Araçatuba. As demais se juntarão à equipe que já trabalha na cidade de São Paulo e na região metropolitana. Ainda não há previsão de quando ocorrerá a distribuição.
“A Cabine Lilás foi um serviço tão fundamental à população que agora se estenderá para todos os 645 municípios do estado, aumentando ainda mais a rede de proteção das mulheres. Várias vidas já foram salvas pelo serviço até aqui”, observa o comandante do Copom de São Paulo, coronel Carlos Henrique Lucena.
Mais de 4 mil atendimentos
A Cabine Lilás já atendeu mais de 4,3 mil chamados por meio do número 190 em sete meses. Foram mais de 2,5 mil orientações sobre como obter a medida protetiva, sendo que 21 agressores foram detidos com o apoio das operadoras da cabine por descumprimento das regras impostas pela Justiça.
O serviço de proteção e rede de apoio à mulher pode ser solicitado pela própria vítima ou ser ofertado pelo atendente, caso a mulher queira falar diretamente com uma policial ou se tiver dúvidas em relação a quais medidas adotar caso seja agredida.
“Em quase todas às vezes, as mulheres nos ligam quando já aconteceu a agressão, quando o suspeito não está mais no local. Enquanto a gente despacha a viatura até o endereço, ficamos com a pessoa na linha dando apoio psicológico e passando as orientações”, comenta a policial Raiane.
A cabo também reitera que muitas vítimas ligam já fragilizadas e com vergonha de irem até a delegacia. Então elas são orientadas a abrir um boletim de ocorrência sem sair de casa, através do aplicativo SP Mulher Segura. A denúncia é direcionada diretamente para a DDM Online.
Em alguns casos, as vítimas fogem de casa depois da agressão sofrida e não têm para onde ir. Ao ligar na central 190, a cabine Lilás encaminha a vítima para uma rede de abrigo, onde são orientadas sobre como obter o auxílio-aluguel, de como fazer cursos profissionalizantes e a recolocação no mercado de trabalho.
Combate à violência contra a mulher
As Delegacias da Mulher registraram 122 mil boletins de ocorrência em todo o território paulista de janeiro a agosto. Além da Cabine Lilás, o estado disponibiliza 141 DDMs — sendo que 11 funcionam 24 horas – e 142 salas DDMs, onde a vítima é atendida por videoconferência por uma equipe especializada.
Como as subnotificações para o crime ainda são altas, o governo de São Paulo tem promovido campanhas para incentivar as vítimas a denunciarem os agressores. Em março deste ano, foi promovido o movimento “São Paulo por Todas” para ampliar a visibilidade das políticas públicas para mulheres, bem como a rede de proteção, acolhimento e autonomia profissional e financeira que viabiliza serviços exclusivos para elas.
Uma dessas frentes foi o lançamento do aplicativo SP Mulher Segura. Além de permitir o registro do boletim de ocorrência de forma online, o app possui um botão de pânico para emergências e realiza de forma ininterrupta o monitoramento do agressor com tornozeleira eletrônica, que foi ampliado — isso permite uma rápida ação da polícia em caso do infrator tentar se aproximar das vítimas que possuem medidas protetivas.
Também houve a criação do auxílio-aluguel de R$ 500 para vítimas de violência doméstica, e da ampliação de linhas de crédito e de entregas das Casas da Mulher Paulista, que oferecem serviços de apoio psicológico e capacitação profissional.
Já o protocolo Não Se Cale foi implementado para acolhimento imediato e combate à importunação sexual em bares, restaurantes, casas de show e similares, formando equipes em um curso online oferecido gratuitamente aos profissionais do setor.