Morreu o príncipe encantado do cinema, o ator francês Alain Delon. Nos tempos áureos do cinema, ele me deixava com complexo de inferioridade. Minha namorada, na poltrona ao lado do cinema, respirava pelo galã da tela, quando numa ligeira olhada, durante o filme, ela me espiava com o canto do olho, via aquele rapazinho feio, espinhento. Que desgosto! Mas era o que havia para o momento. Ela conseguiu só aquilo, estava contente.
Agora, na velhice, emparelhamos. Alain Delon enfeou-se e eu, com a caridade divina, fiquei mais bonito, pois a velhice desperta a caridade dos olhos.
Alain Delon era para ser açougueiro, mas o destino o quis ator. Então, chega-se à conclusão de que há muita gente bonita no seio da pobreza, faltou-lhes oportunidade para mostrar a sua beleza na tela ou na telinha. E esse desencontro é eterno na história da humanidade capitalista.
Quando vejo uma menina pobre namorando um feio e ainda pobre, fico consternado, ninguém para lhe dizer que há um desperdício, que ela pode tentar um homem melhor no mercado da beleza.
Meu mano Gervásio dizia que a gente pode até namorar uma mulher velha (e a gente velho também), mas que ela tenha sido bonita na juventude. Filosofia malandra. Esse jogo juventude-velhice tira a alegria de muita gente, mas ninguém, dizia minha avó, fica sem a sua tampa, não há caldeirão sem tampa. É só procurar, ou melhor, é só paquerar.
E para consolo geral, beleza não se põe na mesa, e o que é belo hoje, poderá ser feio amanhã. O conceito de beleza é relativo, depende de cada época.
Sílvio Santos só acumulou
Não li nada sobre Sílvio Santos, nem quero saber o seu nome verdadeiro, vou ignorá-lo como sempre fiz. Ele é um homem do sistema que conseguiu driblar. Nunca comprei nada dele, nem carnê. Era uma pessoa que brincava com as pequenas esperanças dos pobres. Não gosto das pessoas oportunistas, o cara não tinha escrúpulos.
Mas como posso julgar as pessoas, sem conhecer os detalhes de sua vida. Não estou querendo perdoar bandido, mas nem sempre as pessoas fazem o que querem. Não somos só maldades e nem só bondades. Até santos habitam os presidiários.
Nestes tempos mais exigentes, Sílvio Santos foi denunciado em várias situações, até foi acusado de racista. Eu confundia a voz dele com a do Lombardi. Pelo menos as acusações sobre ele não foram tão graves como as do ex-dono das Casas Bahia (Samuel Klein)
Posso falar bem dele, como também posso esculhambar com o apresentador. Vai depender de que lado vou jogar os holofotes. Pablo Neruda foi admirado como poeta, até recebeu prêmio Nobel de Literatura, mas agora descobriram que seus biógrafos esconderam o lado obscuro do escritor.
Sílvio Santos me chamou atenção, mas só isso, apenas se preocupou em construir um belo patrimônio; mas também não posso esconder que foi uma personalidade da TV brasileira. Inté, meu caro!
*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Membro das academias de letras de Araçatuba-SP, de Andradina-SP, de Penápolis-SP, Itaperuna-RJ.