Na última quinta, Chico Buarque, talvez um dos maiores da MPB, completou 80 anos. Escrever sobre ele dias após a data é chover no molhado, diante de tudo o que se falou do compositor, escritor, dramaturgo e ativista. A novidade é, justamente, a mais óbvia de tudo: Chico fez 80 anos.
Fez 80, como Caetano, Gil, Milton e Paulinho da Viola fizeram 81, pois são safra 1942/43. E que safra. Chico é o caçula desta geração, pouquinho mais velho que Bethânia, atualmente com 78, e outras duas vozes de ouro que já encerram a temporada de shows por aqui: Gal e Elis, que fariam 80 no próximo ano.
A MPB continua a presentar ouvidos exigentes com gente como Chico César, Zeca Baleiro, Lenine, Mônica Salmazo, Ana Carolina, Maria Gadu e, claro, Maria Rita. Todos talentosos e talentosas (não encontrei nos dicionários adjetivo mais adequado), com público fiel, mas sem a vocação para ídolos formadores de opinião, como é a turma de 1942/1945.
Os ídolos estariam em extinção? Não acredito. Penso que uma série de acontecimentos e fatores contribuíram para que esse pessoal de 80 ou mais sejam ídolos ainda hoje. Eles tiveram influência direta de João Gilberto, beberam na fonte, a ponto de frequentar a casa do maior influenciador da música popular brasileira pós-anos 60.
Chico, Caetano, Gil, Milton, Paulinho da Viola, Gal, Bethânia e Elis surgiram nos festivais universitários nos fins dos anos 60, momento crítico da história recente do Brasil, então mergulhado numa ditadura militar. E por terem sido projetados em circuito de vanguarda (condição do estudante universitário na época), tiveram de romper as barreiras do mercado e para isso contaram com a disposição dos fãs.
Por serem malditos, as gravadoras não disponibilizavam jabaculê para “incentivar” as emissoras de rádio a tocarem suas músicas. Os fãs tinham de garimpar para encontrar um LP comentado por um crítico musical num jornalão ou no rodapé de revistas de entretenimento. Nas prateleiras das lojas de discos, a cada dez trolhas encontrava-se uma joia da MPB.
A luta contra a ditadura é a marca daquela geração, apesar de que Chico César, Zeca Baleiro e seus contemporâneos não deixaram a peteca cair durante o governo golpista apeado do poder pelo voto. Todavia, a geração anterior foi vítima de censura, perseguição de todo tipo, prisão, tortura e exílio.
Talvez, o somatório destes acontecimentos tenha contribuído para um fã-clube tão sólido, pois são os responsáveis por uma cultura nacional e por uma música brasileira genuinamente popular. Apesar de que não somos iguais aos nossos pais, nossos ídolos ainda são os mesmos.
Antônio Reis é jornalista em Araçatuba, fotógrafo diletante e ativista cultural