“O menino marrom“, livro de Ziraldo que havia sido suspenso em escolas municipais de Conselheiro Lafaiete/MG, voltará às prateleiras das instituições de ensino municipais após decisão judicial. A prefeitura e a Secretaria de Educação do município determinaram a suspensão temporária do uso da obra, devido a reclamações de pais de alunos que consideraram certos trechos inapropriados.
Alguns genitores destacaram partes do livro que mencionavam possível pacto de sangue entre as personagens. “‘Temos que fazer o pacto de sangue!’. Um deles foi até a cozinha buscar uma faca de ponta para furar os pulsos.” O suposto pacto na história, entretanto, não se concretiza, porque os meninos decidem usar tinta. Outro trecho mencionado é um pensamento negativo que o protagonista tem sobre uma idosa que recusou sua ajuda para atravessar a rua.
Censura prévia
Uma ação popular foi movida em resposta à medida tomada pelo município. A autora do processo aponta que a suspensão constitui censura e viola liberdade de expressão e princípios educacionais. O juiz de Direito Espagner Wallysen Vaz Leite, da 1ª vara Cível de Conselheiro Lafaiete, concedeu a liminar solicitada pela parte autora, determinando o cancelamento imediato da suspensão.
Ele destacou que a medida da Secretaria de Educação carecia de fundamentação legal e estava em desacordo com a CF, a qual garante a liberdade de expressão e proíbe qualquer tipo de censura prévia. A decisão sublinhou que apenas a classificação indicativa pode restringir o acesso a obras literárias e que a retirada do livro privava alunos de ensinamentos importantes a respeito de racismo e amizade, temas centrais na obra de Ziraldo.
Com a liminar, a suspensão temporária foi anulada, e a prefeitura deverá retomar imediatamente o uso do livro nas escolas, sob pena de multa diária em caso de descumprimento. O advogado Eduardo Gravina representa a parte autora na ação.
- Processo: 5006658-14.2024.8.13.0183
- Veja a decisão.
O livro
A obra “O menino marrom” trata de temas como racismo e amizade ao narrar a vida de Lucas, um menino de pele marrom, e sua amizade com um menino de pele branca.
Juntos, eles exploram suas diferenças e semelhanças, aprendendo a valorizar e respeitar as características que os tornam únicos. Em situações cotidianas e aventuras compartilhadas, os amigos descobrem que a verdadeira beleza reside na diversidade e que a amizade transcende quaisquer barreiras impostas pela aparência.
Caçadas de Pedrinho
A obra “Caçadas de Pedrinho”, de Monteiro Lobato, também foi parar nos tribunais nacionais, mas sob a acusação de conteúdo racista. Caberá à 1ª seção do STJ julgar o caso, após o STF, em 2020, entender que não tinha competência para a matéria.
A ação se estende no Judiciário desde 2010, quando o CNE – Conselho Nacional de Educação determinou que o livro não fosse mais distribuído às escolas públicas, devido a passagens consideradas problemáticas na narrativa. Um dos trechos dizia: “É guerra e das boas. Não vai escapar ninguém – nem Tia Anastácia, que tem carne preta.” Outro trecho afirmava: “Tia Nastácia, esquecida dos seus numerosos reumatismos, trepou, que nem uma macaca de carvão.“
- Processo: MS 27.818