Uma sociedade sem a presença do Estado pode subsistir? Qual a função do Estado? Critica-se o Estado, porém, podemos viver sem ele? No que consiste o capitalismo? A teoria política anarquista prega a existência de uma sociedade sem Estado. Mikhail Bakunin, filósofo e revolucionário anarquista (1814/1876), defendia a desnecessidade do Estado para a vida civilizada em sociedade. Segundo ele, sem o Estado, a sociedade teria num primeiro momento desordens e crises, mas, depois, pacificação e normalidade.
O Estado, para Mikhail (vide em sua obra, Estatismo e Anarquia – Excertos), atende somente aos interesses de classes privilegiadas, como o clero (igreja), a nobreza, a burguesia e a “classe culta” (intelectuais). Para o filósofo, onde há Estado, há escravidão. Para a ideologia anárquica, o cidadão pode viver sem ordem (repressão do Estado), lei e propriedade privada. Mikhail, pelo que li de suas ideias e ideologias, era bom de teoria, mas acéfalo na prática: era um teórico utopista.
Sabemos que no mundo real – não quimérico, o Estado limita a liberdade do cidadão, agindo como ente regulador/opressor, cobra impostos, todavia, a sua presença é necessária: seja o Estado “máximo” ou o Estado “mínimo”, conforme o grau de intervenção dele na vida do cidadão e na economia. O Estado “mínimo” surgiu com a corrente do liberalismo clássico, tendo como teóricos mais influentes Adam Smith e Stuart Mill. Sob a ótica política, o Estado “máximo” está ligado à ideologia de esquerda (Estado “gigante”), enquanto o Estado “mínimo”, de direita (Estado “anão”).
O anarquismo e o comunismo têm em comum a ideologia pelo fim da propriedade privada. O Estado, para o comunismo, deve ser o “dono” e controlador absoluto do cidadão e das coisas. A aceitação da violência é outra característica da anarquia, sendo o Estado um obstáculo para a sua revolução ideológica. Para o marxismo, porém, a presença do Estado é necessária, mas este ente controlaria a vida do cidadão e todos (classe operária e as demais) viveriam na mesma condição (igualitarismo utópico), com o fim da divisão de classes e a produção seria administrada pelo Estado.
“Caindo na real”, o anarquismo nunca existiu e talvez nunca existirá. A teoria marxista que prega o “comunismo puro” também é irreal, porque a igualdade com esse formato é fantasiosa. O capitalismo, por sua vez, sabemos, é um sistema econômico adotado em quase todo o mundo, baseado na propriedade privada, no lucro e no trabalho assalariado. O capitalismo não é perfeito, mas segue o caminho “do meio” ou da razoabilidade: mantém a propriedade privada, as liberdades do cidadão e a presença do Estado (ente regulador).
Uma das maiores críticas ao capitalismo consiste no fato de um número muito pequeno de pessoas acumularem grande parte da riqueza do mundo, causando progressiva desigualdade social e ameaça ao progresso social: esse é o “calcanhar de Aquiles” do capitalismo. Sob um olhar crítico, façamos a indagação: será que o mercado financeiro e as empresas bilionárias do mundo são opressores/controladores do cidadão comum (mesmo que adequadas ao sistema capitalista)? Fica, pois, a reflexão …
Não confiar no Estado (executivo, legislativo e judiciário), assim, é uma tendência anarquista. A terceirização/privatização da justiça e da segurança pública geraria insegurança jurídica e pública ao cidadão. Para o anarquismo, o Estado não funciona e nunca funcionará, porque é burocrático e corrupto. Enfim, a única certeza que se tem, portanto, é a de que não há sistema econômico ou político ideal ou perfeito. E mais: sem lei, ordem (coerção) e propriedade privada, a sociedade sucumbiria.
Seja como for, resta ao cidadão exigir a manutenção dos seus direitos e liberdades, com a certeza de que o Estado e a política não resolverão todos os seus problemas. Nesse cenário, afastando-se de teorias/ideologias anárquicas ou comunistas, o sistema capitalista – o que sobra – necessita de aperfeiçoamento, sob pena de aumentar a desigualdade social e afetar o progresso no mundo.
Adelmo Pinho é promotor de justiça em Araçatuba e articulista do RP10