Hélio Consolaro*
Escrever sobre o futebol é chover no molhado, pois é uma atividade lúdica que virou profissão e é transmitida por centenas de canais de TV e rádio, além da internet. Com tanta variedade de gente falando do assunto, restou pouco para este cronista.
O uso da palavra “civilização” foi pensada e repensada por este cronista, atitude própria de quem escreve: pensar. No clube, acontece tudo, os interesses estão sempre à flor da pele, seguir a ética não faz parte da rotina dos dirigentes. Pode não ser tanto assim, mas é o que me chega pela mídia.
Se o futebol fosse proibido, teríamos milhares de desempregados. Desde o aparador de gramas do campo até o técnico. Em cada clube existe também os advogados e os burocratas.
Eu mesmo vivo com o televisor ligado em jogo de futebol. Torço para o Palmeiras, mas gosto mesmo de assistir a jogos de outros times, sofro menos. Quanto mais pernas de pau, melhor para meu gosto. Esse negócio de assistir a jogos de clubes europeus não faz parte de meus hábitos.
Estou perdendo a tesão pelo selecionado brasileiro, ainda mais com a vinda de um técnico estrangeiro para treiná-lo. O futebol pentacampeão não merece tal rebaixamento.
Não fico mais sentado à frente da TV para ver o jogo, ligo o aparelho e vou fazer outra coisa. Quando o gol sai, corro ao aparelho. Estou virando um neurótico multimídia.
Como se trata de uma atividade humana, o futebol tem o DNA da humanidade. As mazelas sociais estão presentes também nos esportes. Se fosse enumerar todas, encheria esta página. Vou ficar apenas com o sopapo dado pelo preparador físico Pablo Fernandes no jogador Pedro no último jogo de Flamengo e Atlético-MG. Sob o ponto de vista xenófobo, um argentino deu na cara de um brasileiro.
Há algumas décadas, técnico de futebol batia na cara de jogador no vestiário, intervalo de jogo, porque estava jogando mal. Mala preta, qual é o bicho e outras expressões eram comuns nas transmissões de jogo.
Atualmente uma partida de futebol na televisão é cheia de refinamentos e protocolos, muitas regras. Temos até VAR. Isso anda até educando o povão para a cidadania, a questão do racismo é um exemplo. Por meio da Taça dos Libertadores, o brasileiro aprende geografia, sabe que o Brasil pertence a um continente, América do Sul. Com tantos técnicos estrangeiros dando entrevista, estamos virando um país bilingue.
Mas o sopapo levado pelo Pedro foi mesmo uma covardia. Tudo acontece no Flamengo. Foi a São Paulo jogar contra o Palmeiras, a torcida rubro-negra matou uma torcedora palmeirense, foi a Belo Horizonte, sai briga nos vestiários, dá BO na delegacia de polícia. Técnico de futebol não para no time. Sem falar no incêndio nos aposentos da base, lá no Ninho do Urubu. Está faltando filosofia, civilização na administração do clube. O muito dinheiro do time anda corrompendo os agentes.
Fazer o quê, segundo Machado de Assis, o ser humano é a última merda que o urubu deixou sobre o toco. Tanto é que o escritor não quis ter filhos, talvez por medo de que os rebentos herdassem a sua epilepsia.
Só me resta terminar esta crônica com aquela frase feita: assim caminha a humanidade, às escuras, destruindo o planeta.
*Hélio Consolaro é professor, jornalista e escritor. Membro das academias de letras de Araçatuba-SP, Andradina-SP, Penápolis-SP e Itaperuna-RJ