Reza a lenda que na idade média “Joana” reinou como papa e governou a Igreja católica. Não existe, porém, fonte ou prova segura da veracidade da existência da suposta papisa e a maioria a reputa como uma ficção, advinda de uma sátira antipapal. Verdade ou mentira, mas, uma papisa pode surgir?
O viés conservador do catolicismo vem sendo mitigado pelo atual papa, Francisco. Ele é considerado progressista e tem enfrentado temas polêmicos, como a pedofilia na igreja, o fanatismo mundial e o casamento entre pessoas do mesmo sexo, deixando de lado dogmas tradicionais do catolicismo. Em 26 de abril deste ano (2023), numa decisão histórica, Francisco autorizou o voto feminino no Sínodo dos Bispos, reunião em que se debate e decide questões ideológicas e internas da igreja.
A discussão sobre a igualdade de gênero aumentou na gestão de Francisco, fazendo com que mulheres ingressem no protagonismo de decisões inéditas no Vaticano. A possibilidade do diaconato (primeiro grau de ordenação católico) feminino na igreja católica deu o seu primeiro passo em 2016, quando Francisco criou uma comissão para discutir o assunto. O motivo da resistência feminina no baixo ou alto clero na igreja católica estaria ligado ao fato histórico, de que Jesus somente escolheu homens para serem apóstolos.
Em 1994, o papa João Paulo II, na carta apostólica, Ordinatio sacerdotalis, decidiu que não caberia à igreja discutir tal assunto, ou seja, para ele, o dogma permaneceria. Poderia, talvez, a corrente progressista do catolicismo fundamentar que: se a igreja admite a canonização de mulheres, que são declaradas santas, por que em vida não podem ser ordenadas, como padres e bispos?
Ou, então, se Deus criou o ser humano (o homem e a mulher) à sua imagem e semelhança, por que a mulher não pode ser sua intermediária e ordenada na fé, como o homem? Santo Agostinho escreveu: se alguém vier a firmar a autoridade do texto sagrado contra a razão clara e manifesta, quem faz isso não sabe o que empreendeu; porque opõe à verdade não o significado da Bíblia, que está além de sua compreensão, mas apenas na sua própria interpretação, não o que está na Bíblia, mas o que encontrou em si e imagina que esteja lá.
Enfim, a interpretação à Bíblia sobre esse tema deve manter-se conservadora ou progressista? A bíblia revela que Jesus foi o maior defensor da igualdade e dos excluídos socialmente. Será que, interna corporis, a igreja católica resistirá aos anseios sociais pela igualdade entre o homem e a mulher? O empoderamento da mulher na igreja certamente trará bons efeitos para toda a sociedade. A papisa, nesse cenário, poderá deixar de ser lenda para se tornar realidade? Só o tempo dirá…
*Adelmo Pinho é promotor de justiça em Araçatuba e articulista do RP10