As declarações do vereador Maurício Bem-Estar (PP) a respeito de portadores do TEA (Transtorno do Espectro Autista) ganharam repercussão nacional após o apresentador Marcos Mion usar suas redes sociais para criticar o parlamentar e afirmar que ele não entende “a extensão e necessidades do TEA na escola” e que seu posicionamento é de exclusão dos autistas do ambiente escolar.
O vereador afirmou, durante a 1ª sessão ordinária da Câmara, na última segunda-feira (8), que há mais de mil tipos de autistas e colocou em dúvida a necessidade destes alunos terem acompanhante especializado ou monitor na escola.
O parlamentar também cita a atuação dos médicos, que segundo ele, não podem prescrever acompanhante ou monitor para seus pacientes, pois “estariam entrando na área pedagógica.”
O posicionamento dele foi em defesa à resolução do município que estabelece regras para disponibilizar profissionais para acompanhar os portadores de TEA na sala de aula.
Uma delas estabelece que o atestado médico indicando o transtorno não irá obrigar o Seistema Municipal de Educação a contratar o profissional indicado pelo médico, “considerando que este não tem hegemonia, nem autoridade para determinar como serão conduzidas as questões educacionais”.
Para a jornalista Fátima De Kwant, que é ativista na causa autista, ao deixar o encargo do grupo de apoio pedagógico das escolas o poder de julgar se a criança autista deve ou não ter AT, o município estaria favorecendo a exclusão destes alunos.
“Com isso, muitas delas estão, injustamente, sem esse profissional indispensável para o sucesso de seus filhos na escola, já que um grupo pedagógico, independente da boa vontade ou competência, nem sempre consegue fazer um julgamento correto para o aluno autista, sem o aval do médico especialista”, escreveu Fátima, que também manifestou a sua indignação ao reproduzir o vídeo em que o vereador profere sua falar.
“Deixa eu contar algumas barbaridades que acontecem com as crianças autistas nas escolas sem AT (acompanhante terapêutico). Uma delas fica com fezes na cueca porque (apesar de falar um pouco), não sabe ainda pedir por ajuda na higiene”, escreveu em sua postagem no Instagram.
Ela afirma, ainda, que os acompanhantes para os autistas nas escolas não é um favor, mas um direito conquistado por leis federais. Na postagem, ela diz que é um recado para a Prefeitura de Araçatuba, para o vereador Maurício, Secretaria Municipal de Educação e para todas as escolas do município que não estão liberando acompanhantes para alunos autistas com requerimento médico.
Já o apresentador Marcos Mion, em sua postagem no Instagram, disse: “Em pleno 2023 ainda tem vereadores falando abertamente sobre excluir autistas da escola? Questionando os direitos conquistados?”, perguntou.
Nota de repúdio
Engrossando o coro contrário ao que disse o vereador, mães de crianças com o TEA (Transtorno do Espectro Autista) protocolaram, na manhã desta quarta-feira (8), uma nota de repúdio na Câmara Municipal de Araçatuba, contra as declarações do parlamentar.
A nota chama de desinformação a afirmação do vereador de que há mais de mil tipos de autistas. “Trata-se de um espectro, nenhum autista é igual ao outro, como nenhum ser humano é igual ao outro e isso não faz um ter menos ou mais direito perante seus pares”, diz o documento, que é assinado pelo projeto TEAjudo, que presta apoio a pais de autistas, e também por familiares de crianças e adolescentes com TEA de Araçatuba.
O grupo ressalta, ainda, na nota, que quanto a inclusão escolar de portadores de TEA, a lei 12.764 de dezembro de 2012, traz os direitos da pessoa com Transtorno do Espectro Autista. “Em casos de comprovada necessidade, por meio de relatórios e laudo médico, a pessoa com TEA será incluída nas classes comuns de ensino regular e terá direito a acompanhante especializado”, afirmam.
Conforme a coordenadora do TEAjudo, Solange Nery, eles irão representar a Prefeitura e o vereador no Ministério Público de São Paulo. O mesmo disse o vereador Luiz Boato. “Vamos ao Ministério Público, porque as crianças não podem ficar sem os atendimentos especiais”, afirmou.
Outro lado
O vereador Maurício Bem-Estar disse que foi mal interpretado e que em nenhum momento teve a intenção de promover a exclusão de autistas nas escolas.
“Estou em uma casa de leis, tenho que fiscalizar, não excluo ninguém, tenho até uma sobrinha com necessidades especiais e sei da luta diária destas mães com seus filhos”, afirmou.
Ele disse que sua fala foi em defesa da resolução municipal que estabelece as regras para definir quem precisa de acompanhantes nas escolas. “Isso deve ser feito pela equipe técnica da Prefeitura, que tem competência para isso. O médico pode até sugerir, mas não cabe a hegemonia dele nestes casos.
“Já pensou se toda indicação de médico falando que precisa de um acompanhante tivesse que ser cumprida, será que o municípo daria conta? Para a mãe é melhor não ter acompanhante, para que os filhos sejam mais independentes e interajam com os colegas”, disse.
Sobre sua afirmação de que há mais de mil casos de autismo, ele disse que não soube se expressar corretamente. “Eu quis dizer que há tipos de autismo leve, moderado e grave”, explicou. Ele também disse que errou ao dizer que o jogador argentino Leonel Messi é autista e, apesar disso, é o melhor do mundo.
Prefeitura
A reportagem questionou a Prefeitura a respeito dos critérios para a disponibilização de acompanhantes para os autistas na escola e a secretária municipal de Educação, Silvana Sousa e Souza, enviou a seguinte nota, que é publicada abaixo na íntegra:
“A recomendação médica é uma opinião técnica relevante, porém não exclusiva. É impossível falar em necessidade educacional especial sem envolver diversos olhares como o da equipe técnico-pedagógica e o da equipe multiprofissional numa análise da criança em seu contexto educacional. É importante esclarecer que não existe uma pessoa com autismo igual a outra e que cada um dentro da sua singularidade necessitará de diferentes níveis de suporte, sendo que alguns necessitam de muito pouco ou nenhum em razão de possuírem autonomia e desenvolvimento intelectual dentro do esperado para a sua idade.
Na rede municipal temos 525 alunos com deficiência em atendimento, sendo 249 com o diagnóstico de TEA e 33 com hipótese diagnóstica. De todas as solicitações de acompanhante, em apenas 3 casos a análise final concluiu que não seria necessário porque a criança não possui barreiras que impedem seu processo de desenvolvimento e, desta forma, fazendo uso dos apoios oferecidos também às demais crianças, conseguirá ter o seu desenvolvimento assegurado. Prova disso é que uma das crianças que a avaliação das equipes técnico-pedagogica e multiprofissional concluíram ser desnecessária a presença de acompanhante, aos 5 anos já está consolidando seu processo de alfabetização.
Caso os solicitantes não concordem com o relatório final da Equipe Multiprofissional, poderão recorrer no prazo improrrogável de 15 dias, contados a partir da data da ciência do relatório, que será julgado pelos membros da Equipe Técnico-Pedagógica e pelos membros da Equipe Multiprofissional conjuntamente, os quais emitirão um único parecer conclusivo. Até o momento não recebemos nenhum pedido de reconsideração.”