A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou nesta terça-feira (7) a decisão do ministro Nunes Marques e manteve a cassação do mandato do deputado estadual Fernando Francischini (União Brasil-PR). Dos cinco ministros da turma, dois votaram a favor de manter o mandato do deputado: o próprio Nunes Marques e Andé Mendonça – ou seja, os dois indicados por Bolsonaro ao Supremo.
Os votos para revogar a decisão monocrática de Nunes Marques foram de Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes. A decisão também mantém a inelegibilidade de Francischini por oito anos.
Primeiro a declarar voto contrário à decisão, Fachin afirmou que “às vezes é necessário repetir o óbvio. Não existe direito fundamental em atacar a democracia a pretexto de se exercer qualquer liberdade. A lealdade à constituição é devida a todos, sobretudo aos agentes políticos, que só podem agir respeitando-a”.
Autor do voto que decidiu a cassação de Francischini, Gilmar Mendes, deu um recado claro a Bolsonaro e a outros políticos que atacam o sistema eleitoral e a urna eletrônica. “Não há como legitimar o mandato de alguém que é escrutinado sob o registro eletrônico de voto, mas que ostenta características de potencializar a desconfiança da população nas urnas sob a qual ele mesmo foi eleito”, disse Mendes.
Ataque às urnas
A cassação de Francischini foi decidida pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por 6 votos a 1 em outubro de 2021. O então candidato foi considerado culpado de disseminação de notícias falsas sobre fraudes nas urnas eletrônicas durante as eleições de 2018.
No dia do primeiro turno das eleições daquele ano, Franscischini fez uma live em que afirmou que urnas eletrônicas haviam sido fraudadas para atrapalhar a eleição de Bolsonaro, que então era seu colega no PSL.
Nunes Marques determinou a devolução do mandato e dos direitos políticos do bolsonarista na última quinta-feira (2), em decisão monocrática. No sábado (4), a ministra Cármen Lúcia solicitou que a decisão fosse analisada pelo plenário do STF. O julgamento começou em sessão extraordinária e chegou a ser interrompido por um pedido de vistas de André Mendonça, mas foi retomado pela segunda turma na tarde desta terça.
Histórico de lealdade
Não é a primeira vez que Nunes Marques adota posições claramente ligadas a interesses de Jair Bolsonaro. Um dos indicados pelo presidente, ao lado do “terrivelmente evangélico” Mendonça, ele tem tomado uma série de decisões favoráveis ao presidente, como mostrou o Brasil de Fato em março.
Entre elas, estão a liberação da pesca de arrasto, parte da agenda anti-ambiental de Bolsonaro, e a liberação de cultos e manifestações religiosas em abril de 2021, no pico da pandemia de covid-19 – depois derrubada pelo plenário do STF.
Em dois momentos, ações de Marques levaram à interrupção de julgamentos de interesse do governo. Em setembro, ele pediu vistas e travou o julgamento de ações que questionavam decretos de Bolsonaro para facilitar acesso a armas de fogo. Três ministros já haviam votado pela inconstitucionalidade da medida.
Outro caso foi um mandado de segurança que questionava se o presidente pode bloquear seguidores nas redes sociais. Nunes Marques pediu destaque, interrompendo a discussão no Supremo.
Reação
O presidente Jair Bolsonaro reagiu na tarde de hoje à decisão do STF, durante ato cerimônia de lançamento do Programa Brasil pela Vida e pela Família, no Palácio do Planalto, em Brasília (DF).
Dizendo-se “indignado” com a decisão, Bolsonaro alegou que não existe tipificação penal para fake news, o que, segundo ele, impossibilitaria a condenação do deputado. Mais que isso, reiterou que as alegações de fraude nas urnas eletrônicas em 2018 são verdadeiras.
“Pode alguém ser punido por fake news? E se esse fake news for uma verdade, pior ainda! Esse deputado não espalhou fake news, porque o que ele falou na live eu também falei pra todo mundo, que estava acontecendo fraude nas eleições de 2018″, disse.
“Se for para punir fake news com derrubada de página, fecha a imprensa brasileira, que é uma fábrica de fake news, em especial Globo, Folha”, completou o presidente, em novo ataque à imprensa.
O presidente também criticou o TSE por supostamente não aceitar as sugestões apresentadas pelas Forças Armadas, que segundo Bolsonaro descobriram “centenas de vulnerabilidades”. “Convidaram pra que, ora bolas? Pra fazer papel do que? Eu sou o chefe das Forças Armadas. Nós não vamos fazer papel de idiotas”, afirmou.
“Tenho a obrigação de agir. Tenho jogado dentro das quatro linhas. Não acham uma só palavra minha, um só gesto, um só ato fora da Constituição. Será que três do STF, que pode muito, podem continuar achando que podem tudo?”, lamentou.
Bolsonaro ainda atacou diretamente o ministro do STF Edson Fachin. “O ministro eu solta o Lula é o mesmo que está à frente do TSE, dando as cartas como dono da verdade”, frisou.