Um grupo de refugiados da Venezuela que vinha para Araçatuba passou fome e frio no aeroporto de Campinas, após a Azul Linhas Aéreas cancelar o voo que sairia às 22h30 de terça-feira (11). Todos os demais passageiros foram levados a um hotel pela companhia e tiveram jantar, café da manhã, almoço e um voucher de R$ 37,00 para consumo no aeroporto. Aos venezuelanos, foi dito que não tinham direito ao pernoite e às refeições porque suas passagens haviam sido doadas.
A história chegou ao Regional Press por meio da empresária Amanda Barbosa, que também estava no voo e ficou sabendo do caso quando voltou ao aeroporto para embarcar, na tarde de quarta-feira (12). “Nós não acreditamos quando soubemos que eles foram obrigados a ficar no aeroporto, sem assistência alguma da companhia. Isso é desumano”, afirmou, emocionada.
O grupo de venezuelanos, formado por sete pessoas, incluindo uma criança de cinco anos e um bebê de cinco meses, acabou dormindo nas cadeiras do aeroporto. A única comida que tinham era pão com presunto e queijo que haviam levado de Manaus, onde embarcaram para Campinas na tarde de terça-feira, para pegar o voo até Araçatuba à noite.
Para alimentar o bebê, tiveram de pedir água quente a funcionários de um restaurante para fazer a mamadeira. Para espantar o frio, usaram as roupas que traziam na mala.
“A comida no aeroporto é muito cara, não tivemos condições de comprar nada, não tínhamos dinheiro”, conta Kirka Aliseny Acive Rodríguez, 43 anos, que é professora e decidiu se mudar para Araçatuba, onde sua filha de 23 anos já residia, pois não conseguia emprego em Boa Vista, onde morava desde 2018.
Ela afirma que se sentiu humilhada quando foi convidada, junto com os seus compatriotas, a se retirar do micro-ônibus que levaria os passageiros da Azul para o hotel, já na madrugada de quarta-feira (12), após o cancelamento do voo.
“Eu me senti muito mal quando disseram que não tínhamos direito a comida e a hotel. Foi humilhante, choramos muito, porque passamos fome e frio”, conta.
Para a empresária Amanda Barbosa, o que a companhia fez foi desumano. “Eles nem nos deram a oportunidade de ajudar essas pessoas. Achamos estranho quando reparamos que o grupo de venezuelanos não estava no hotel, mas não podíamos imaginar que haviam deixado uma família inteira com fome e frio no aeroporto”, disse, indignada. “Se a gente soubesse disso na hora, ninguém irei para o hotel em solidariedade a eles”, falou.
Os venezuelanos vieram da cidade de El Tigre, estado de Anzoátegui. Lá, Kirka trabalhava como professora substituta, mas não conseguiu renovar o contrato com a escola. Ela conta que a vida estava muito difícil em seu país, com muitas filas para conseguir comprar alimento e preços exorbitantes.
A decisão de se mudar para o Brasil foi em 2018. Ela veio com o marido para Boa Vista (RR), onde ele trabalha como segurança e pedreiro. No entanto, com a pandemia de Covid-19, as coisas se tornaram ainda mais difíceis para a família, por isso ela decidiu se mudar para Araçatuba, onde a sua filha mora com o marido, que trabalha como auxiliar de lavanderia no Hospital Neurológico Ritinha Prates.
Para conseguir as passagens de avião, o grupo contou com o apoio de uma ONG. Eles saíram de Boa Vista até Manaus, onde foram acolhidos, e depois embarcaram para Campinas, de onde vieram para Araçatuba.
Kirka já está instalada na casa de sua filha, nas Chácaras TV, em Araçatuba. Ela precisa de um emprego para ajudar nas contas da casa e enviar dinheiro para os seus pais, que ficaram em El Tigre. O restante do grupo está morando com o ex-marido de Kirka, que já residia em Araçatuba e decidiu apoiar os amigos na batalha por uma vida melhor.
Sobre o ocorrido no aeroporto, ela diz que tem medo de que seus compatriotas sejam prejudicados com uma possível retaliação pela empresa por tornar o caso público. “Espero que ninguém tenha que passar pela humilhação que passamos. É muito triste isso acontecer e ainda na frente de crianças”, finalizou.
O outro lado
O Regional Press procurou a Azul Linhas Aéreas, mas até o momento não houve resposta. O espaço continua aberto.