O juiz José Daniel Dinis Gonçalves, da Vara da Fazenda Pública de Araçatuba, negou o pedido de liminar em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público contra o prefeito Dilador Borges (PSDB), para que o decreto municipal 21.329, de 22 de abril, que autorizou a retomada de uma série de atividades durante a quarentena imposta pela pandemia de Covid-19, fosse suspenso. O MP vai recorrer da decisão no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP).
O decreto municipal, publicado na semana passada, permitiu a abertura de salões de cabeleireiro, barbearias, salões de beleza, manicures, pedicures e afins; lojas de produtos ortopédicos; escritórios de contabilidade, advocacia, imobiliárias, estabelecimentos prestadores de serviços em geral, estabelecimentos comerciais que trabalham com a modalidade de pagamento mediante carnê e crediário e comércio de peças e acessórios para automóveis, motocicletas e bicicletas.
Na ação civil pública, o Ministério Público afirma que o prefeito desobedeceu o decreto estadual 64.881, de 17 de abril de 2020, que em seu artigo primeiro estendeu as medidas de quarentena até 10 de maio. No entendimento do MP, cabe ao governador do Estado coordenador as ações de vigilância epidemiológica e de vigilância sanitária.
“A competência de ditar as normas de quarentena e especificar quais serviços e estabelecimentos devem fechar, funcionar ou reabrir é do governador. Ao prefeito restaria apenas executar e não coordenar os serviços relacionados às vigilâncias epidemiológica e sanitária”, afirmou a Promotoria, na ação.
“AUTONOMIA DOS ENTES”
Em sua decisão, o juiz da Vara da Fazenda Pública, no entanto, citou que o plenário do Supremo Tribunal Federal firmou entendimento, quando do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 5341, de que as medidas adotadas pelo Governo Federal na Medida Provisória 926/20 para o enfrentamento do novo coronavírus não afastam a competência concorrente, nem a tomada de providências normativas e administrativas pelos estados, Distrito Federal e municípios.
“Por maioria, os ministros aderiram à proposta do ministro Edson Fachin sobre a necessidade de que o artigo 3º da Lei 13.979/2020 (que dispõe sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus), seja interpretado de acordo com a Constituição, a fim de deixar claro que a União pode legislar sobre o tema, mas que o exercício desta competência deve sempre resguardar a autonomia dos demais entes”, disse o juiz, em sua sentença.
Conforme ele, venceu o entendimento que, embora haja possibilidade de o chefe do Executivo federal definir por decreto a essencialidade dos serviços públicos, a ausência observância da autonomia dos entes locais, afrontaria o princípio da separação dos poderes.
“E é o caso dos autos, pois suprimir a competência do ente municipal de dispor de forma concorrente quanto a essencialidade, acaba-se por infringir o princípio da separação de poderes e adentrar no mérito administrativo quanto a conveniência e oportunidade do ato”, disse o juiz.
Ele citou também o artigo 198 da Constituição Federal, que prevê que as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único.
O magistrado afirmou ainda, em sua decisão, que o decreto municipal 21.313/20, de Araçatuba, criou e impôs normas de distanciamento, aglomeração e higienização sanitária.
“EXCÊNTRICA SITUAÇÃO”
Para o Ministério Público, “a medida adotada por Araçatuba cria uma excêntrica situação, na medida que, enquanto outros municípios seguem os comandados estaduais, Araçatuba – mesmo sendo sede de relevante região administrativa do Estado e polo de importante influência no interior do Estado – busca desviar-se, escapar da quarentena, incentivando a aglomeração de pessoas, em contraponto às medidas de isolamento social”.
Conforme a ação, com as medidas adotadas pelo governo municipal, o próprio município passa a atuar como verdadeiro dispersor e propagador da Covid-19 para todas as cidades vizinhas.
“Não há dúvida de que Araçatuba será visitada por milhares de pessoas, vindas de outros municípios, onde predomina o isolamento social, com destino ao usufruto dos serviços dos diversos estabelecimentos cuja reabertura fora autorizada pelo decreto municipal”, cita a ação civil pública. Para o MP, os atos do prefeito Dilador Borges Damasceno causam efeitos danosos não apenas na vida e saúde dos araçatubenses, mas de todos os habitantes da região de Araçatuba.
A ação civil pública é assinada pelos promotores de Justiça Cláudio Rogério Ferreira, Luiz Antonio de Andrade, Albino Ferragini, Joel Furlan e José Augusto Mustafá.