A velha rádio-patrulha não era tão veloz; mas nenhum meliante, ainda que ágil, escapava à sua guarnição. Não era tão espaçosa; mas dezenas de crianças vieram ao mundo em seu estreito banco traseiro. Não era tão possante; mas retirou bois de piscinas, vítimas ilhadas de enchentes, motociclistas de precipícios, carros possantes e majestosos de fétidos atoleiros.
Não era sofisticada; mas rodava no asfalto e na lama, na pedra ou na água, na areia, e chegou mesmo a cruzar pontes trepidantes, sobre as quais nenhum outro veículo se arriscaria a passar. E como era frágil de aparência… a rádio-patrulha não parecia um cavalo fogoso, um tigre ou uma águia, era mais parecida com um besouro, de que, aliás, imitou a técnica de parecer inviável, mas de dar certo; pois resistia às balas, ao serviço ininterrupto.
Às mudanças abruptas de temperatura e a manutenção insuficiente, e, modesta, só exigia em troca combustível para rodar. Seu rádio era tosco, mas acionava todo um povo nas calamidades. Não poderia ser classificada como bonita ou nobre, mas escoltou com dignidade rainhas e presidentes.
Não era tão confortável, mas serviu de hábitat, dia e noite, sob chuva ou sob sol, as gerações de patrulheiros que com ela se pareciam. Pois atletas, isso não eram, mas não se tem notícia de que perdessem uma corrida, na maratona de perseguir um assaltante.
Não eram pilotos festejados, mas eram inigualáveis, rápidos e seguros na babel do trânsito da cidade, socorrendo uma vítima ao hospital distante.
Não eram heróis de quadrinho, e seu cinto, singelo como o de um franciscano, não possuía artifícios ou mil e uma utilidades, mas salvaram pessoas de carne e osso, deram conselhos, reconciliaram casais, sorriram e se emocionaram, impediram crimes e orientaram crianças, fizeram amigos e batizaram legiões de recém nascidos.
E algumas vezes, morreram. Longe de casa, olhando para o teto da rádio-patrulha e para as estrelas cintilantes muito além, seus rostos banhados pela luz intermitente, vermelha, que piscava, nos braços de seu companheiro de guarnição.
Humildes e discretos, poucos os apontavam, reverentes, pelas ruas, mas os criminosos os odiavam e temiam. E os cidadãos de bem, que um dia deles precisaram, os veneravam.
Ninguém fez Polícia como eles; ninguém era tão versátil como eles; e ninguém viveu mais intensamente do que eles.
A eles, a Polícia Militar de nossos dias deve sua personalidade, sua autoridade, o respeito que a sociedade lhe devota. E o que sabe – e sabe muito – sobre como fazer Polícia.