Investigação constatou que, se não fosse a ação de um software, modelos de 2011 e parte da linha 2012 da picape Amarok teriam sido reprovados na inspeção
Uma investigação conduzida pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) concluiu que a Volkswagen usou o mesmo dispositivo que fraudou testes de emissões nos Estados Unidos para contornar deliberadamente a fiscalização ambiental brasileira na venda de picapes do modelo Amarok.
Com base nos resultados de perícias encomendadas à Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb), o órgão constatou que, não fosse a ação de um software que programa os veículos para emitir menos poluentes em laboratórios, modelos de 2011 e parte da linha 2012 da picape Amarok teriam sido reprovados na inspeção pela qual qualquer automóvel é submetido antes de ser liberado à venda no País.
A multinacional alemã vendeu no mercado brasileiro 17 mil veículos da picape equipados com o dispositivo. Importadas da fábrica da Volks na Argentina, as picapes têm o com o mesmo motor a diesel desenvolvido e fabricado na Alemanha que foi alvo de investigação americana.
O relatório do Ibama rejeita a versão da montadora de que, embora presente nos veículos – o que, por si só, corresponde a uma infração ambiental -, o dispositivo não foi determinante para que a Amarok ficasse dentro do limite de poluição permitido a esse tipo de veículo. Em sua defesa, a montadora chegou a informar no processo que o dispositivo sequer foi acionado.
O Ibama diz, porém, que as novas medições mostraram que, quando está rodando nas ruas, a picape emite 10% mais óxidos de nitrogênio do que o permitido.
Esse fato, diz o órgão, só não foi detectado nos testes feitos durante o processo de homologação do modelo porque o acionamento do dispositivo permite reduzir as emissões desse contaminante atmosférico em 0,26 grama por quilômetro rodado nos ensaios em laboratório. Assim, as emissões do poluente ficavam abaixo do máximo permitido pela legislação – de 1 grama por quilômetro – nos testes de homologação, enquanto em condições normais de uso as picapes emitem, na média, 1,1 grama por quilômetro, aponta o laudo entregue pela Cetesb em janeiro.
Levando em conta o tempo de uso dos carros e o número de picapes irregulares em circulação, o Ibama estima que 100 toneladas de óxidos de nitrogênio podem ter sido dispersas ilegalmente na atmosfera.
Punição. Por causa da violação ambiental, o Ibama anunciou a multa de R$ 50 milhões à montadora em novembro de 2015, dois meses após o escândalo explodir nos Estados Unidos. Mas só agora o processo – que abriu espaço para defesa da empresa – foi julgado em primeira instância. A empresa tem 20 dias para recorrer mais uma vez contra a autuação. Depois disso, a decisão do órgão só poderá ser questionada em um processo judicial. A Volkswagen informou que foi notificada na última quinta-feira, que está analisando a decisão e se manifestará “oportunamente”.
Embora a fraude tenha sido enquadrada no nível máximo de gravidade do Ibama, a multa é a maior que pode ser aplicada por crime ambiental no País. Não fosse tal limitação, a penalidade seria de R$ 238,8 milhões, em conta na qual o Ibama leva em consideração agravantes como a intenção da empresa de cometer fraude.
A montadora também foi autuada em R$ 8,3 milhões pelo Procon/SP, fundação que defende o interesse dos consumidores. Nesse caso, a multa segue sendo contestada na Justiça.
Recall
No ofício encaminhado na terça-feira ao presidente da Volkswagen no Brasil, David Powels, o Ibama não só comunica a aplicação da multa, mas cobra da montadora a realização de um recall dos veículos Amarok equipados com o software manipulador de testes.
Nos Estados Unidos, pelos termos do acordo da montadora com as autoridades – incluindo o Departamento de Justiça e a agência de proteção ambiental americana -, os consumidores têm a possibilidade de recomprar até 460 mil automóveis da marca Volkswagen e outros 15 mil da Audi, bem como a opção de encerrar contratos de leasing sem multas.
O custo pode chegar a US$ 10 bilhões caso todos clientes lesados decidiam devolver os veículos. A Volks se comprometeu ainda a pagar outros US$ 2,7 bilhões em compensação ambiental e a investir US$ 2 bilhões na promoção do uso de carros de emissão zero.
À época do acordo nos EUA, a Proteste cobrou em ofícios enviados à Volkswagen e ao Ministério Público que as condições oferecidas aos americanos fossem replicadas no Brasil.